O perigo da bondade

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Pedro Cattapan, Roberta Jansen, Roseann Kennedy e Raphael Montes, na gravação de Dois pontos #39 (2024)

Divulgação, de novo! Após divulgar na semana passada o lançamento do livro Percursos psicanalíticos no Brasil [CATTAPAN (org.), 2024], no qual entrevisto Teresa Pinheiro, Jurandir Freire Costa e Joel Birman, chega a vez de divulgar situação inversa - uma ocasião em que sou um dos entrevistados.

Dessa vez, a publicação que divulgo é a da trigésima nona edição do programa Dois pontos, conduzido pela jornalista Roseann Kennedy, do Estadão, na qual participo. Além dela e de mim, participam do programa a também jornalista Roberta Jansen, do mesmo meio, e o escritor de ficção Raphael Montes. 

O ensejo para o debate é a seguinte frase proferida anteriormente pelo próprio Raphael Montes: "Pessoas que só têm pensamentos bons são perigosas" (sic.). A partir dessa provocação, a conversa flui para discussões sobre nossas cultura contemporânea, sua estética (dos politicamente corretos ou do discurso de ódio), moral (dos homens de bem, libados e da ressurreição da moral religiosa) e política (da intolerância instaurada pelo neofascismo que, dentre outras coisas, facilitou o acesso dos brasileiros às armas, e suas consequências no tabuleiro político) que tentam estabelecer ideais de bondade e pureza que são, em si, bastante perigosos e costumam ser cutucados pela literatura de Montes.

Como na conversa se declinam os três significantes que dão nome a este blog (psicanálise, arte e cultura), entendo que cabe divulgar aqui o programa na íntegra. Foi uma conversa agradável e de ótimo nível com os outros três interlocutores.

Imagem retirada de comercial 'clássico' de margarina dos anos 1970-80 

O debate se debruça sobre o lado sombrio, sinistro, estranho (FREUD, 1919), que sempre está presente em qualquer existência humana, mesmo que queiramos - em massa - parecer com personagens de comercial de margarina, Pollyannas, Barbies ou Cary Grants, através da conduta cotidiana presencial e principalmente online, através de redes sociais como Instagram, Facebook ou mesmo aqui, no Blogger. Busco apresentar os conceitos de Inconsciente (FREUD, 1915), fundamento da psicanálise, e de sujeito dividido (LACAN, 1960), precisamente a partir deste lado sombrio e estranho de quem só quer se ver como bom, mas, mesmo assim, se torna perigoso para os outros e, às vezes, para si.

Mais do que com a estética destes produtos idealizados, a estética de nossa conversa combina mais com aquela do cinema de Alfred Hitchcock (p.e. em Interlúdio [HITCHCOCK, 1946] ou Disque M para matar [id., 1954]) ou de David Lynch (p.e. em Veludo Azul [LYNCH, 1986] ou A estrada perdida [id., 1996]), cada um mostrando que, por mais que deixemos a fachada limpinha, a sujeira está presente também entre os que parecem limpos, inclusive os 'populares' (no sentido atual, ser 'popular' não é ser do povo, mas ser pop, ter se tornado uma imagem adorada por muita gente), os chamados ímpios, as pessoas de bem, numa palavra - The beautiful people (Marylin MANSON, 1996). 

Importante notar que a manchete do programa não condiz integralmente com o debate que se assiste nele. Pode parecer que se trata de uma conversa em sintonia com o típico discurso de coach e seus jargões, mas, muito pelo contrário, o que o espectador poderá ver ali é uma constante crítica àquele. Sei que quem tem lido meu blog com uma certa frequência realmente não poderia imaginar coisa diferente, mas há sempre aqueles que chegam aqui mais ou menos desavisados, de modo que a advertência faz sentido.

Eis o link de acesso ao programa: #39 POSITIVIDADE TÓXICA: excesso de 'pensamentos bons' pode ser um problema? | Dois Pontos (youtube.com)

Fica sendo essa a postagem da semana, já que no programa pensamos a cultura contemporânea justamente a partir da interlocução entre o campo psicanalítico e o artístico, no caso, através da interessante obra literária de Raphael Montes - operação que não é muito diferente do que costumo fazer aqui neste espaço, porém em forma de texto - e não de vídeo/áudio -, em diversas de minhas postagens.

Capa de Pollyanna, edição da L&PM (Eleanor H. PORTER, 1913)

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